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O Autismo

O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é um distúrbio que clinicamente se manifesta por atraso ou desvio nas aquisições do neurodesenvolvimento e por alterações de comportamento. Há dificuldades de interação e comunicação social, que associadas ao comportamento repetitivo, permitem diferenciar o autismo das outras perturbações do desenvolvimento. O diagnóstico é clínico, não há até hoje nenhum exame que possa dar o diagnóstico. A criança deve apresentar dificuldades nas 3 áreas principais que caracterizam o ‘tripé” para o diagnóstico: Dificuldades na aquisição e desenvolvimento da linguagem verbal, dificuldades na interação social e padrões de comportamento estereotipado e repetitivo.

O que causa o autismo?

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A minha definição é que o autismo é uma síndrome comportamental de base biológica. Com raízes na suscetibilidade genética, mas se assemelhando aos Erros Inatos de Metabolismo.

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É muito importante que se separe a definição de autismo de doença psiquiátrica. As novas pesquisas apontam o TEA se desenvolvendo como consequência de um processo dinâmico, de causa genética,  onde ocorrem mudanças no metabolismo e função celulares por todo o corpo, incluindo o cérebro. Estas mudanças celulares podem estar relacionadas a insultos ambientais que podem atingir o desenvolvimento da criança desde o útero materno ou durante o seu desenvolvimento. Os estudos apontam para a relação entre a predisposição genética e a intoxicação materna e agressões imunes, ou inflamatórias que possam afetar o neurodesenvolvimento ou o metabolismo da criança.

É importante que se entenda que o TEA é um transtorno de origem genética com muitas manifestações clínicas, e não apenas uma condição com origem apenas no cérebro. Não ocorre devido a relacionamento dos pais com a criança ou a qualquer outro problema psicológico. Não é o mesmo que retardamento mental. Não é o mesmo que esquizofrenia e não deve ser comparado a psicose infantil.

Image by Caleb Woods

O autismo raramente é diagnosticado antes dos 2 anos. Mas há indicações de que os primeiros sintomas comportamentais são manifestados ainda no primeiro ano de vida e estes sintomas deveriam ser avaliados corretamente e acompanhados pelo pediatra da criança. Do ponto de vista prático, talvez o mais fácil para capacitar as pessoas a identificar sinais de risco seja a capacidade de perceber as características normais e mais comuns dos bebês, que não são encontrados de forma consistente nos lactentes com suspeita de autismo: Alegria , curiosidade, prazer no contato físico com outros , o aconchego, a busca pela “atenção” das outras pessoas , a busca pelo olhar dos outros, a vontade de compartilhar o interesse com o adulto, a descoberta do “dedinho” indicador por volta de um ano quando a criança quer sinalizar o que lhe interessa e por fim, o desenvolvimento adequado da linguagem comunicativa verbal e não verbal.

Image by Jordan Whitt

O acompanhamento deve ser multidisciplinar. As crianças geralmente necessitam de terapias regulares como acompanhamento por psicologia, fonoaudiologia, psicopedagogia, terapia ocupacional e terapias de reabilitação. Há também terapias específicas desenvolvidas para o transtorno autista como ABA, TEACCH, Sonrise, Floortime, dentre outras. Estas terapias começaram a chegar ao nosso alcance no Brasil há poucos anos e nós pais ainda nos vemos aflitos em consegui-las, pois o número de terapeutas especializados ainda é pequeno e elas são muito dispendiosas.

O tratamento médico deve ser constante, e a criança necessita de avaliações nas áreas de neurologia, psiquiatria, pediatria, genética e nutrologia. O tratamento biológico para o autismo tomou grande evidência devido ao surgimento um grande corpo de pesquisa e publicações científicas que comprovam as alterações orgânicas que acompanham essa síndrome, como a maior prevalência neste grupo de problemas gastrintestinais ou alérgicos, porém estes problemas devem ser comprovados por exames que comprovem se este transtorno é prevalente naquela criança especificamente. A premissa do tratamento biológico é que as mudanças do metabolismo celular são a base dos problemas encontrados no corpo e no cérebro dos pacientes com autismo e que muitos destes problemas podem ser aliviados com um tratamento não medicamentoso, mas semelhante ao que se usa para crianças com Erros Metabólicos. Mas antes de tudo friso que o diagnóstico etiológico é fundamental. Corrigir alergias e deficiência metabólicas pode ajudar a saúde geral da criança, mas todas as especialidades devem trabalhar em conjunto para que a criança possa alcançar seu máximo potencial. Deixo aqui o alerta de que não há pílula mágica ( eu a teria dado à minha filha se ela existisse ), mas sim um trabalho integrado, humanizado, com uma interação fraterna entre os especialistas e cuidadores, visando a saúde integral daquela criança em particular e de sua família.

Image by Alireza Attari

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O trabalho de inserção do autista na sociedade se inicia na aceitação das diferenças e no trabalho árduo de pais, profissionais e políticos engajados em promoverem a inclusão social. Este trabalho deve priorizar a promoção do bem estar emocional do indivíduo com autismo e o estímulo à sua autonomia pessoal.

Falar de inclusão em uma sociedade tão avessa a este tema é difícil. O nosso mundo ainda vê o diferente como um incômodo. O trabalho de inclusão deve começar com as crianças desde tenra idade. O convívio com as diferenças desde a educação primária auxilia as crianças a perceberem que os indivíduos se diferenciam apenas pelas suas ideias, desejos e opções de vida e elas precisam ser ensinadas que o diferente não é o errado. É apenas diferente...

O diagnóstico de autismo afeta toda a família da criança, e este trabalho de inserção social também deve ser estendido à ela. A socialização da família também fica prejudicada e os pais ficam impactados com o stress constante, a dificuldade dos membros da família em lidarem com a situação pessoalmente e com o problema financeiro para custeio de terapias e tratamentos.

Ainda hoje lutamos no Brasil para que todos reconheçam a lei Berenice Piana (lei número 12.764) que é a Lei de Proteção aos Direitos da Pessoa com Autismo, lei que equipara o autista à pessoa com deficiência para todos os direitos legais.

Essa inserção aos nossos olhos começa com a instituição de políticas públicas voltadas para a pessoa com autismo, a atenção integral à sua saúde, a inclusão dos estudantes com o transtorno em classes comuns de ensino regular e o estímulo à inserção da pessoa com autismo no mercado de trabalho.

Image by Robo Wunderkind

Devo dizer que discordo da posição de que o autismo causa sempre deficiência intelectual. Há um número de casos de autismo que cursam com retardamento mental, mas muitos pacientes apresentam QI na média, e outros até acima da média. Começo então lhes dizendo que o autismo poderia ser visto como uma dificuldade do indivíduo em manifestar socialmente seu potencial interior. Vários indivíduos adultos com autismo puderam descrever seus problemas de contato com o mundo como Carly Fleischmann que era considerada uma pessoa com graves comprometimentos, que ainda é não verbal, e que conseguiu se manifestar através da digitação em computador. Ela já escreveu livros, poemas e tem uma página na internet aonde descreve suas dificuldades de comunicação e interação social, mas aonde consegue demonstrar a grande riqueza interior que há nas pessoas afetadas pelo autismo. Como ela há Tito Mukhopadhyay que escreveu livros como “ Dentro de Minha Mente Autista” e Naoki Higashida que escreveu “O que me faz pular”. Os dois são autistas não verbais que escrevem lindamente através de digitação.

A genialidade de alguns autistas, também chamada de habilidade “savant”, se refere à indivíduos autistas com altas habilidades. Estima-se que 10 a 15% dos indivíduos com autismo possam apresentar savantismo. Existem muitas formas de habilidades savant. A maioria delas envolvem habilidades para cálculos matemáticos, memorização, habilidades artísticas e musicais. Ainda não se sabe ao certo o que proporciona estas habilidades mas as teorias são de que as áreas cerebrais voltadas à sistematização estariam mais ativas no cérebro de pacientes autistas do que as áreas voltadas ao processo de empatia.

Uma habilidade savant deve ser aproveitada e estimulada para direcionar o indivíduo à uma atividade produtiva na vida adulta baseada em seus interesses.

Um exemplo de autista com altas habilidades que foram direcionadas para uma função produtiva é o de Temple Grandim. Ela também era uma criança com diagnóstico grave e sem linguagem. Os médicos davam um prognóstico à sua mãe de que ela seria um adulto incapacitado e com retardamento mental. Hoje ela trabalha no Departamento de Ciência Animal da Universidade do Colorado e é professora e projetista das instalações da indústria de carne de boa parte dos EUA. Sua história está escrita num livro muito interessante que têm tradução para o português e que se cama “Uma Menina Estranha”. Além disso, hoje Temple dá palestras em todo o mundo ajudando milhares de pais a compreenderem o que há no mundo interior dos autistas e como ajuda-los a alcançarem o seu máximo potencial.

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