Quando tive que organizar o luto pela passagem do meu pai, também entendi que vivi muito tempo o luto pelo autismo de minha filha. Vejo uma quantidade imensa de mães na internet que parecem nunca conseguirão vencer este luto. Não falo aqui, absolutamente, em se acomodar com o autismo, em deixar a criança como é porque a vida assim o quis, e não lutarmos com todas as forças e por todos os meios para que ela melhore. Falo da perda da criança idealizada. Daquela que sonhávamos em ter. Daquela que achamos perdida. Organizar o luto...colocação difícil. Padre Fábio nos diz que devemos organizar nosso luto, venha ele de onde vier. Não é um caminho fácil, mas é um caminho que não podemos evitar. Ele diz que devemos encarar a situação como uma batalha perdida e que, se desejamos recomeçar nossa vida do jeito certo, precisamos primeiro reconhecer que ela está perdida. A partir deste luto começam novos desafios para nós. Tudo muda. E necessitamos nos fortalecer para vencer uma nova etapa de nosso caminho. Precisamos sepultar muita coisa dentro de nós também, para podermos prosseguir a vida e não prolongar o tempo de sofrimento. Olhar de frente esta dor, sem medo. Por isso temos que organizar o luto para que se inicie o processo de cura dentro de nós. Se nós não permitimos que o objeto do luto parta, se nós insistimos em aprisiona-lo em nós, ele fica como que amarrado, atado às nossas costas. E isto se torna um fardo tão, mas tão pesado, que teremos muita dificuldade em carregar e prosseguir nosso rumo. Assim, estendemos a nossa dor. Realmente Padre Fábio está certo. Não podemos aprisionar o que já não é nosso, o que já não existe, o que já partiu. Por que trago estas reflexões baseadas no que Padre Fábio disse?...Bem, porque de minha parte, permiti que o luto do autismo perdurasse tempo demais! E me arrependo pelos momentos em que não vi minha filha, pois estava ainda esperando ver a idealizada e sonhada surgir de dentro dela. Perdi tempo! Perdi tempo de estar com ela com espírito de amor e entrega e não com este fardo pesado às costas. Padre Fábio diz que temos que trancar a porta de onde insistimos em contemplar a estrada vazia. E que temos que reconfigurar a vida à partir da ausência estabelecida. Se eu não posso voltar o tempo, pelo menos desejaria que os novos pais pudessem fazer isto: Reconfigurar a vida. Se o filósofo Henri Bergson disse mesmo que o ser humano precisa de um ELÃ VITAL ( um motivo para ir adiante), nada mais belo do que ter meus filhos como meu elã vital. E com minha mocinha com todo seu autismo, mas com toda sua ingenuidade e pureza que, se popularizados fossem, fariam deste mundo um lugar melhor.